Pra quem não leu o texto publicado no jornal O Hoje (Goiânia), como prometido olha a versão completona dele aí e com fotos inéditas!
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Sempre fui uma pessoa amante do sol. De ficar horas torrando embaixo dele. De me sentir feliz depois de correr e suar no Parque Flamboyant às 10 horas da matina de um sábado qualquer. Sempre preferi andar de calça jeans, regata e havaiana, que o chiquê europeu de sobretudos, gorros e cachecóis. Analisando isso, dá para imaginar o que passei no último inverno a -20C.
A gente só entende a importância do sol quando não o tem – assim como a maioria das coisas na vida – e para uma brasileira, acostumada com o ameno sol de Goiás, as coisas ganham outra proporção. A falta de sol deixa a gente triste, introspectivo, depressivo. É difícil explicar. Moro no norte da Holanda e, para se ter uma idéia, as universidades disponibilizam atendimento psicológico gratuito aos estudantes internacionais durante o inverno. Além disso, o governo distribui cápsulas de vitamina D (sintetizada pela luz do sol e que propicia a sensação de felicidade e prazer) e oferece linhas telefônicas gratuitas 24 horas para aqueles que estão depressivos. Além disso, lugares turísticos como torres de igrejas ou parques naturais com precipícios ficam fechados de dezembro a fevereiro. Tudo isso representa o esforço de barrar uma taxa de suicídio que cresce até 66% durante a estação mais fria do ano.
A maioria dos dias é cinzenta e, quando o sol brilha lá fora, mas quem é quem coragem de sair de casa com a temperatura constante na casa dos -20C? Resultado? Passamos boa parte do tempo sozinhos e em casa. Soma-se a isto a distância cultural e a barreira lingüística. Pronto, é receita para os brasileiros se deprimirem. Eu não tenho vergonha de dizer. Durante o inverno fiquei totalmente depressiva. Certa noite, com ataque de pânico, conectei o skype com minha mãe até as 3 da manhã para conseguir me acalmar. A única coisa que pensava era “o que é que eu estou fazendo aqui?”. Cheguei a colocar as coisas na mala para embarcar no primeiro vôo de volta para o Brasil. Eu só queria minha terra. E o sol. E a neve, branca e silenciosa, não caía do lado de fora porque, ao menos se ela estivesse lá, seria sinal que a temperatura estava em torno dos -7C e não uma dezena de graus abaixo. Não pense que é coisa de menina mimada. É até engraçado, porque só quem viveu essa experiência sabe o prazer e a dor que ela traz. Morar no frio, ter uma rotina no inverno, definitivamente não é a mesma experiência que passar as férias em Paris no mês de janeiro.
Mas eis que o sol chegou. Ontem a primavera começou no hemisfério norte. Hoje, o humor já é outro, as pessoas são outras. Nas duas últimas semanas se pôde observar a transição entre as estações e o surgimento das primeiras flores. As pessoas realmente mudam. As cores das roupas saem do preto e marrom para vermelho, amarelo, laranja, pink, azul anil e uma infinidade de verdes. Os óculos de sol ainda estão meio empoeirados, mas já emolduram os rostos das mulheres maquiadas com batons coloridos e lenços presos despretensiosamente no pescoço. Os homens já sorriem e paqueram as meninas-com-rosto-pintado de cima de suas bicicletas. Os cantores de rua já tocam os primeiros acordes pelas esquinas. O motorista do ônibus está mais simpático; hoje me contou que o que mais queria era largar o trabalho e tomar uma cerveja porque “o sol chegou”. Na lojas, na faculdade, em qualquer lugar, as pessoas já começam a carregar um semblante mais leve e sorridente.
Há alguns dias um amigo brasileiro me disse algo que é a pura verdade: “aqui, a gente percebe porque as tulipas são bonitas”. Não pelas cores, odor ou pela beleza dentro das casas, mas porque elas começam a florescer nos primeiros dias da nova estação; marcando a passagem, o renovar do ciclo, o reinício da vida. Para reforçar, ainda essa semana, uma amiga alemã postou uma foto no facebook com a legenda “primeiro café no terraço de verão”. Hoje, voltando do supermercado, ouvi um pássaro cantando na janela do vizinho – coisa que não ouvia a quase um ano. E parecia que ele enchia os pulmões e gritava para todo mundo, acordando até aqueles que ficaram fazendo festa até as sete da manhã: “levanta da cama! O sol está esquentando! Põe um jeans e vai pra rua!”. Será preciso prova mais consistente do quanto a primavera é importante?
Dito tudo isso, é de se entender porque os cafés, restaurantes, praças e parques ficam lotados em qualquer dia da semana, mesmo em horário de expediente. Todos viram o rosto e fecham os olhos à procura do sol; permanecendo assim por vários minutos. Após quase quatro meses fechados dentro de escritórios, sempre com quatro paredes em volta e uma em cima, o que as pessoas mais querem é almoçar embaixo do sol (costume bem comum por aqui e quase impensável no Brasil), conversar embaixo do sol, estudar embaixo do sol. E todos querem o sol. Qualquer réstia de luz atrai dezenas de pessoas. É, a nova estação, que por aqui é chamada de “estação da felicidade”, chegou. Não tem como negar. E Hoje, ela foi marcada por algo bem simples: tomei um sorvete de casquinha, sentada no meio-fio, embaixo do sol. Quer coisa melhor que isso para lembrar que o inverno acabou? É a vida recomeçando.
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